Pelas ruas de Curitiba: Confeitaria das Famílias, autora de uma das receitas mais famosas do país, é marco histórico da capital paranaense
Com o passar dos anos e a presença regular, alguns locais passam a ter uma forte conexão com a gente. E quando a regularidade se torna um hábito, é criada uma tradição carregada de boas memórias. Já falei por aqui, por exemplo, do significado afetivo do Passeio Público de Curitiba. E incluo nessa mesma categoria de relação a “Confeitaria das Famílias”, um dos mais antigos empreendimentos em funcionamento da Rua XV de Novembro, na capital paranaense — que é a rua mais famosa da cidade, também conhecida por Rua das Flores, uma das primeiras do Brasil a ser fechada para circulação exclusiva de pedestres.
Inaugurada em outubro de 1945 pelo espanhol Jesus Alvarez Terzado, a Confeitaria das Famílias entrou no meu itinerário frequente como sinônimo de pausa e reflexão acompanhada por boa comida. Desde a minha juventude até hoje, é para lá que eu vou em busca de um cafezinho e um doce depois do almoço ou no meio da tarde aos finais de semana, com amigos, familiares ou mesmo sozinho. Aprecio a boa cozinha e um doce bem preparado. As opções que encontro no balcão do lugar estão na minha top list — e olha que já experimentei muitas sobremesas ao redor do mundo.
A preferência não é exclusividade minha, mas também de milhares de pessoas que, ao longo das décadas, tornaram-se clientes assíduos e garantiram a longevidade do negócio. O local foi ganhando notoriedade no decorrer dos anos, principalmente, a partir de 1954, quando, por lá, foi criada a famosa Torta Martha Rocha, que se tornou seu carro-chefe.
A receita da torta de fondant da Confeitaria das Famílias — inspirada em um bolo espanhol, é feita com massa de pão de ló, recheada com creme de ovos, nozes e suspiros. O recheio também conta com muita história. O doce se transformou em um marco nacional, pois é uma homenagem à baiana Maria Martha Hacker Rocha, a Miss Brasil que representou nosso país no concurso Miss Universo de 1954.
Apesar de apontada como favorita na disputa, Martha Rocha perdeu o título para a norte-americana Miriam Stevenson. O resultado do concurso gerou polêmica na época, e foi considerado injusto pelos brasileiros, que ficaram inconformados com a derrota. Como forma de consolo diante da situação, Jesus Terzado e sua esposa, dona Dair Terzado, lançaram, naquele ano, a receita que fez da Confeitaria das Famílias parada obrigatória para o cafezinho dos curitibanos. Até hoje, muitos visitantes da capital paranaense, além de seus residentes, vão até a confeitaria para provar um dos doces mais emblemáticos do país que mais tarde passou a ser reproduzido amplamente.
Martha Rocha nos deixou em 2020, aos 87 anos de idade, mas o doce inspirado em sua beleza continua sendo o carro chefe da Confeitaria das Famílias, que é um marco histórico da cidade. Aliás, o prédio onde funciona desde a sua fundação, na altura do número 374, é considerado Unidade de Interesse e Preservação por conta de sua importância para a história de Curitiba e para a memória dos curitibanos.
O lugar é uma ótima opção de programa tanto para fazer com os amigos e a família quanto para desfrutar sozinho. Além da famosa Marta Rocha, o doce mil folhas é uma ótima pedida durante um passeio pelo charmoso centro da nossa cidade.